A NÃO INCIDÊNCIA DO FATOR PREVIDENCIÁRIO PARA OS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS COM BASE NA EMENDA CONSTITUCIONAL 20/981
Introdução:
Diante da natureza dinâmica do Sistema da Seguridade Social3 e do subsistema da Previdenciária que sofre influência das alterações das condições sociais e econômicas, surgiu a necessidade de se desestimular as chamadas aposentadorias “precoces” 4.
No âmbito jurídico essas alterações se deram através da Emenda Constitucional 20/98, também chamada de Reforma Previdenciária, que por sua vez em atenção aos valores e princípios Constitucionais consagraram o direito adquirido5 como verdadeira expressão do valor6 justiça em nosso ordenamento.
Todavia, mesmo após a reforma, a ausência de uma idade mínima para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição foi a causa determinante para a criação do Fator Previdenciário7 que num primeiro momento busca desestimular as chamadas aposentadorias “precoces”, contudo uma vez concedido o benefício o fator passa então a funcionar como redutor do valor da prestação e consequentemente acaba por diminuir o custo desse benefício para o sistema.
A criação do Fator Previdenciário surge então como uma ruptura entre o regime anterior e o novo regime, ainda que preservados os mesmos patamares para a concessão da aposentadoria por contribuição, ou seja, 35 anos de contribuição se homem e 30 se mulher.
1 Tese também conhecida como Revisão do Duplo Redutor ou “bis in idem”.
2 Advogada especialista em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito e Mestre em Direito
Previdenciário pela PUC/SP.
3 BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. p.17
4 ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. p. 51
5 O artigo 3º da EC 20/98 assegura expressamente o direito adquirido a concessão do benefício para aqueles
segurados que na data da publicação da Emenda tenham cumprido os requisitos.
6 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito, p.86
7 BALERA, Wagner. Noções preliminares de Direito Previdenciário, p. 206
Contudo, esse tipo de alteração impõe o respeito ao Direito Adquirido e um processo de transição para aqueles que já estavam filiados ao RGPS, ou seja, para aqueles que detinham uma parcela de direito acumulado em virtude do tempo de contribuição sob a égide da legislação anterior a Emenda 20/98.
Assim em consonância com esses princípios e valores a EMENDA 20/98 instituiu a extinção gradativa da Aposentadoria por tempo Contribuição Proporcional, bem como regras especificas para Aposentadoria Integral sem redutor, essas regras são genericamente denominadas de Regras de Transição, cujo conceito básico é colocar a disposição do segurado uma opção menos onerosa em face das novas regras.
Portanto, nossa premissa de raciocínio é de que a Regra de Transição deve ser menos onerosa que a nova Regra instituída e que este é o escopo central das Regras criadas pelo artigo 9º da Emenda 20/98 para os segurados filiados ao RGPS até 16/12/1998.
1. Emenda 20/98
No que se refere às Aposentadorias por tempo de contribuição nas modalidades integral e proporcional em respeito ao direito adquirido somente os segurados que na data promulgação da Emenda tivessem preenchidos todos os requisitos poderiam ser jubilados com essas espécies de benefício na forma originalmente instituída na Lei 8.213/91. Enquanto que para aqueles segurados que na data da Emenda ainda não tivessem preenchidos todos os requisitos foi instituída uma regra de transição, com imposição de um tempo adicional de contribuição (pedágio) e uma idade mínima nos termos da redação do artigo 9º da EC 20/98 que assim dispõe:
Art. 9º Observado o disposto no art. 4° desta Emenda e ressalvado o direito de opção a aposentadoria pelas normas por ela estabelecidas para o regime geral de previdência social, é assegurado o direito à aposentadoria ao segurado que se tenha filiado ao regime geral de previdência social, até a data de publicação desta Emenda, quando, cumulativamente, atender aos seguintes requisitos:
I - contar com cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de
idade, se mulher; e
II - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que,
na data da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante
da alínea anterior.
§ 1º O segurado de que trata este artigo, desde que atendido o disposto no inciso I
do caput, e observado o disposto no art. 4° desta Emenda, pode aposentar-se com
valores proporcionais ao tempo de contribuição, quando atendidas as seguintes
condições:
I - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta anos, se homem, e vinte e cinco anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a quarenta por cento do tempo
que, na data da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo
constante da alínea anterior;
II - o valor da aposentadoria proporcional será equivalente a setenta por cento do
valor da aposentadoria a que se refere o caput, acrescido de cinco por cento por ano
de contribuição que supere a soma a que se refere o inciso anterior, até o limite de
cem por cento.
A regulamentação da regra de transição foi praticamente exaurida pelo Constituinte derivado que fixou regras claras em relação ao tempo de contribuição e/ou tempo de serviço necessários, a idade mínima, o período adicional e os coeficientes das aposentadorias integrais e proporcionais, ou seja, houve um esgotamento da regulamentação de como deveriam ser concedidas as aposentadorias por tempo de contribuição integral e proporcional.
Com a edição da Lei 9.876/99 o Legislador ordinário institui as Novas Regras para Aposentadoria Integral e cria o Fator Previdenciário, com o escopo de dar atendimento ao comando Constitucional de equilíbrio financeiro e atuarial e mediante a permissão prevista no § 7º do artigo 201 que condicionou a aposentadoria aos trinta e cinco anos de contribuição se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher “nos termos da lei”.
Assim no que diz a respeito à Aposentadoria por tempo de Contribuição Integral, os segurados se filiados e somente se filiados8 ao RGPS até 16/12/1998 possuem três possibilidades para a concessão do benefício:
(a) Por força do direito adquirido o direito a Aposentadoria com base no regime originalmente instituído pela Lei 8.213/91;
(b) Através do cumprimento das regras de Transição prevista no art. 9º da Emenda do 20/98 e
(c) Com base no Novo Regime a partir da Lei 9.876/99. Situações que podemos resumir no seguinte quadro:
INTEGRAL: HOMEM/MULHER
35/30 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO ATÉ 16/12/1998 = 100% SB9
35/30 ANOS PÓS 16/12/1998 + PEDÁGIO 20% + IDADE MINIMA = 100% SB
35/30 ANOS PÓS 16/12/1998 = 100% SB + FATOR PREVIDENCIÁRIO
Em relação à Aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, o segurado, desde que filiado até 16/12/1998 tem apenas as duas primeiras opções, ou seja, por força do Direito adquirido ou através das Regras de Transição da Emenda 20/98, tendo em vista a Ser filiado ao RGPS até 16/12/1998 é condição necessária para ter direito as regras transição da Emenda Constitucional 20/98 Salário-de-benefício extinção da Aposentadoria Proporcional no Novo Regime instituído pela Lei 9.876/99.
PROPORCIONAL: HOMEM/MULHER
30/25 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO EM 16/12/1998 = 70% SB
31/26 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO EM 16/12/1998 = 76% SB
32/27 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO EM 16/12/1998 = 82% SB
33/28 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO EM 16/12/1998 = 88% SB
34/29 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO EM 16/12/1998 = 94% SB
30/25 ANOS PÓS 16/12/1998 + PEDÁGIO 40% + IDADE MINIMA = 70% SB
31/26 ANOS PÓS 16/12/1998 + PEDÁGIO 40% + IDADE MINIMA = 75% SB
32/27 ANOS PÓS 16/12/1998 + PEDÁGIO 40% + IDADE MINIMA = 80% SB
33/28 ANOS PÓS 16/12/1998 + PEDÁGIO 40% + IDADE MINIMA = 85% SB
34/29 ANOS PÓS 16/12/1998 + PEDÁGIO 40% + IDADE MINIMA = 90% SB
2. Da não incidência do fator previdenciário Do quadro acima se percebe que a incidência do Fator é devida somente em relação à Aposentadoria Integral e para o segurado que não tinha direito adquirido até 16/12/1998 ou não cumpriu os demais requisitos previsto no artigo 9º da Emenda 20/98, ou seja, comprovou apenas 35 anos de contribuição se homem e 30 anos se mulher.
Contudo, o INSS vem aplicando de forma HIBRIDA as regras de transição da EMENDA 20/98 juntamente com regras instituídas a partir da edição da Lei 9.876/99, fazendo assim incidir um DUPLO REDUTOR nas Aposentadorias Integrais e Proporcionais.
Nas aposentadorias integrais a “mistura” entre as Regras chegou a tal ponto, que muitos doutrinadores10 negam a validade da regra transição instituída na Emenda 20/98, em relação a aposentadoria integral, por ser mais onerosa que regra prevista no parágrafo 7º do artigo 201, porém trata-se na verdade de um conflito aparente entre essas normas.
O INSS simplesmente ignora o fato de o segurado ter implementado a idade mínima e o tempo adicional de contribuição o que lhe daria direito a Aposentadoria Integral ou Proporcional sem redutor, impondo a todos a incidência do FATOR PREVIDENCIÁRIO, ou seja, esse segurado não teve respeitado seu direito a uma regra de transição mais benéfica, ainda que prevista Constitucionalmente.
É importe destacar que não está se discutindo a Constitucionalidade do Fator Previdenciário que já foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal, mas a incidência do Fator Previdenciário (Regra Nova) cumulada com as Regras de Transição da Emenda 20/98.
Para Hermes Arrais Alencar a regra de transição do inc.II do artigo 9º é desprovida de qualquer efeito. Op. cit. p. 406
A ADI 211111 reconheceu a constitucionalidade da Lei 9.876/99 em consonância com o § 7º do artigo 201 da Constituição Federal, assim tratou exclusivamente da Constitucionalidade do Fator Previdenciário para as concessões das Aposentadorias Integrais a partir do novo regime instituído pela Lei 9.876/99, ou seja, para aqueles que optaram pela concessão do benefício cumprindo somente o requisito tempo de contribuição de 35 anos se homem e 30 se mulher.
Em momento algum a ADI 2111 tratou da incidência da Lei 9.876/99 em relação a Regra de Transição, até porque a Regra transição traz uma idade mínima, requisito que existe somente no contexto da Emenda, devendo assim ser afastado Fator Previdenciário para aqueles que preencheram os requisitos da Emenda 20/98 quer na modalidade integral ou proporcional.
A incidência ou não do fator deve ser analisada do ponto de vista da validade, vigência e eficácia das regras de transição da EMENDA 20/98, que no nosso entendimento são válidas e estão em vigor para aqueles que cumpriram seus requisitos, contudo, o INSS vem negando a Eficácia da norma, ou seja, nega a aplicação da norma transição para fazer incidir a regra geral que prevê a incidência do FATOR PREVIDENCIÁRIO, e aplicando assim um Duplo Redutor ou um “bis in idem”.
Ao fazer incidir a Lei 9.876/99 que criou o Fator Previdenciário o INSS aplicou um duplo redutor e impôs um regime Hibrido (regra da emenda + regra do fator), muito mais oneroso para o segurado cujo cálculo considera duas vezes a idade do segurado, resultando no chamado “bis in idem” de redução, especialmente considerando que a idade e o tempo de contribuição fazem parte da Fórmula que compõe o cálculo do Fator Previdenciário.
A matéria já vem sendo discutida nos Tribunais Regionais Federais12, especialmente no que se refere a Aposentadoria proporcional, dada a elevada redução que o sistema adotado pelo INSS impõe ao segurado ao fazer incidir cumulativamente um coeficiente reduzido, idade mínima, pedágio e Fator previdenciário, revelando a complexidade da matéria que acabou por consolidar uma formula de cálculo totalmente desfavorável ao segurado que nem sempre pode efetivamente optar em continuar trabalhando e acaba por aceitar um Aposentadoria que não cumpre seu papel de substituição do salário do trabalhador.
Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarConsolidada.asp?classe=ADI&numero=2111&origem=AP
Decisão da 1ª Turma Recursal de SC autos nº 2007.72.95.007023-4
CONCLUSÕES
A Emenda Constitucional nº 20/98 instituiu a extinção gradativa da Aposentadoria por tempo de Contribuição Proporcional, bem como regras especificas para Aposentadoria Integral sem redutor, essas regras são genericamente denominadas de Regras de Transição.
Os segurados filiados ao RGPS até 16/12/1998 possuem três possibilidades de concessão de Aposentadoria por tempo de Contribuição Integral:
(a) Por força do direito adquirido o direito a Aposentadoria com base no regime originalmente instituído pela Lei 8.213/91;
(b) Através do cumprimento das regras de Transição prevista no art. 9º da Emenda do 20/98 sem a incidência do fator previdenciário.
c) Com base no Novo Regime a partir da Lei 9.876/99, com base em 35 anos de tempo de contribuição se homem e 30 se mulher, porém com a incidência do fator previdenciário.
Em relação à Aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, os segurados têm apenas as duas primeiras opções, dada sua extinção no Novo Regime instituído pela Lei 9.876/99.
Ao fazer incidir a Lei 9.876/99 que criou o Fator Previdenciário para as aposentadorias proporcionais e integrais para os segurados que cumpriram os requisitos da Emenda 20/98 o INSS aplicou um duplo redutor e impôs um regime Hibrido (regra da emenda + regra do fator), muito mais oneroso para o segurado cujo cálculo considera duas vezes a idade do segurado, resultando no chamado “bis in idem” de redução, portanto o Fator Previdenciário não deve incidir sobre os benefícios concedidos com base na EC 20/98.
BIBLIOGRAFIA:
ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios previdenciários. 4. ed. rev. atual. com obediência às leis especiais e gerais. São Paulo: Liv. Ed. Universitária de Direito, 2009.
BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2004.
________________. Sistema de Seguridade Social. 4. ed. São Paulo: LTr, 2006.
FERRAZ JR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito: técnica, decisão e dominação. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
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